quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

PELO FIM DO FAIR PLAY: QUERO PORRADA NOS GRAMADOS

A primeira pancadaria no estádio a gente nunca esquece. A frase me ocorreu ao assistir as cenas de pugilato entre os times do Fluminense e do Cerro Porteño no jogo da semana passada pela copa sulamericana de futebol. Afirmo que a garotada tricolor que foi ao estádio nunca mais esquecerá do furdunço no gramado.

Assisti ao jogo pela televisão e depois escutei as resenhas das mesas redondas. Ouvi dezenas de comentários sobre o absurdo que foi o arranca-rabo: Um péssimo exemplo, mancha o futebol, é uma mácula no jogo limpo e quejandos.

Não sei não, mas quando eu era moleque, e não havia essa frescura politicamente correta, a torcida adorava quando o pau quebrava entre os jogadores dos dois times. Era só começar o qüiproquó que as arquibancadas gritavam:

- Porrada! Porrada!

E digo mais, no tempo em que os jogadores saiam com mais freqüência na porrada dentro de campo eram raríssimas as brigas nas arquibancadas. Alguém há de concordar comigo: A violência nas arquibancadas cresceu na medida oposta ao afrescalhamento do jogo nas quatro linhas. Quem quiser que explique as razões e faça suas sociologias; eu só constato isso.

Jogo de futebol não é espetáculo de ópera ou coisa parecida. É drama, epopéia, catarse coletiva e o escambau. Arquibancada é o melhor divã do mundo. Eu, se fosse dar um conselho a algum psicanalista, diria com absoluta convicção:

- Queres conhecer o inconsciente do fulano de tal ? Observe o comportamento dele numa arquibancada. A arquibancada é o único espaço do mundo que não comporta mentiras - o sujeito mostra efetivamente o que é. E o psicanalista, que no campo de futebol provavelmente deve se sentir tão confortável quanto um judeu ortodoxo na Faixa de Gaza, há de zombar da irrefutável verdade.

Sou, por isso, a favor de uma campanha contra o fair play da dona FIFA. Acho que precisamos incentivar a volta do conflito generalizado em campo - melhor estratégia para acalmar as coisas na arquibancada. Um gol escandalosamente ilegal como o da França contra a Irlanda na última quarta feira é muito mais nocivo ao jogo e incitador de violência que o telecatch Montilla que Flu e Cerro protagonizaram no fim da peleja - que aos olhos da garotada, podem crer, pareceu mais um espetáculo de circo.

Fiz essas observações todas para, na verdade, confessar algo que só pretendia depois de morto, a uma médium de mesa branca durante sessão de psicografia: Nunca esqueci a sensação de euforia - e alegria genuína - que experimentei ao assistir a uma pancadaria entre os jogadores de Brasil e Uruguai em um jogo pela Taça do Atlântico, disputado no Maracanã em 1976.

Estava no maraca, eu e meus oito anos, com o avô e o pai. Ganhamos dos grigos de 2 X1 , mas não me lembro dos gols. Jamais me esqueci, porém, das cenas de pugilato envolvendo jogadores, comissões técnicas, imprensa, gândulas, funcionários da SUDERJ e o diabo.

No auge da confusão, o lateral uruguaio Ramirez - que já tinha caçado Zico em campo - saiu correndo feito touro bravo em direção a Rivelino, que em desabalada carreira deu um elástico sem a bola no gringo e acabou descendo de bunda a escadaria de acesso ao vestiário, num dos maiores tombos da história do futebol. Eu aplaudi com o mesmo vigor com que aplaudia as fanfarronices do palhaço Carequinha. Meu pai e meu avô imediatamente entraram no coro de porrada que a massa, afinadíssima, começou a entoar. E eu, delirante, também comecei a gritar porrada - feliz como pinto no lixo [apud Jamelão] .

A nossa dupla Jairo [goleiro] e Orlando Lelé [lateral direito] estava possuída - os dois devem ter batido mais em uruguaios do que todo o exército brasileiro na malfadada Guerra da Cisplatina. Jairo, aos meus olhos de menino, parecia o King Kong em fúria dando sopapos em aviões no alto do Empire State; virou meu herói imediato.

Um ano depois dessa quizumba, o Ramirez foi contratado pelo Flamengo. Muitíssimo bem recebido na Gávea, jogou ao lado do Zico, brincou com o Rivelino e deu a lição: A briga foi só dentro de campo - depois fica tudo em paz, como deve ser.

Ouso afirmar categoricamente o seguinte: Naquele noite, ao assistir a confusão generalizada que o escrete canarinho e a celeste olímpica protagonizaram no Mário Filho, me tornei uma criança absolutamente pacífica - naqueles gritos de porrada descarreguei oito anos de agressividade e meus avós e pais economizaram fortunas em psicólogos. Sou hoje um professor de história que não vê graça nenhuma em estudar ou falar de guerras e nunca saí no tapa com ninguém.

Descobri em um estádio de futebol, e nisso acredito até hoje, que só há dignidade e honra nas pancadarias travadas dentro das quatro linhas. Fora dali, vira coisa de otário ou bandido.

Assistam abaixo a um compacto do jogo, nas imagens inesquecíveis do Canal 100, e reparem o furdunço nos segundos finais. O mais bonito: O texto do Canal 100, ao contrário do discurso desses carolas de hoje que ficam achando que gramado é sacristia, diz apenas o seguinte: Brasil dois, Uruguai um; com mais uma briguinha, para manter a tradição!

Retirado do Blog do Simas

O mesmo assunto de sempre…

E-mail que recebi hoje de um torcedor do Sport, que não me permitiu identificação, portanto, nào o farei.

Mas, em relação ao conteúdo do e-mail, que é comum na minha caixa postal, responderei.

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Caro RicaPerrone,

Na condição de jornalista respeitável e conhecedor de futebol que é, tendo até como marca registrada a imparcialidade, não consigo entender porque você cita o Flamengo como pentacampeão e fala do título de 87 como se fosse legítimo.

Sou de Recife, conselheiro do Sport e conheço a história de perto. Talvez você seja um dos jornalistas do sudeste que a ignorem em troca de ibope, mas não acredito nisso por ser seu leitor há algum tempo.

Confiando no seu bom senso, espero que faça um post se retratando do equivoco que cometeu dizendo ser o Flamengo o legítimo campeão de 1987.


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Caro amigo,

Essa discussão é aquela que toda vez que alguém começa surge outro pra dizer: “Porra, de novo?!”.

Porque ela já deixou de ser uma discussão lógica e passou a ser uma discussão sustentada por paixão, não por razão. Até porque, por razão, outros tantos envolvidos sairiam manchados também, inclusive o meu time de coração, o São Paulo.

Mas, a verdade é a verdade. Não precisamos nos esquivar dela a troco de um rótulo da CBF ou da FIFA. São apenas entidades que oficializam papeis, mas não a emoção e a legitimidade de uma conquista.

Em 1987 os clubes brasileiros fizeram tudo aquilo que sonhamos até hoje que façam: Se uniram, mandaram a CBF passear, arrecadaram mais dinheiro e fizeram sua liga, igual fazem na Europa e em qualquer país de melhor nível profissional que o nosso.

Mas, para agradar esse ou aquele, a CBF resolveu se meter e assumiu o controle do que seria a segundona, módulo amarelo, como queiram. Inventaram um cruzamento dos campeões da série A com os da série B, o que não faz o menor sentido.

Dirão: Mas que absurdo os não rebaixados de 86 estarem na serie B!

Sim, tão absurdo quanto dezenas de campeonatos brasileiros que contaram com mudanças de formulas e não rebaixaram os times do ano anterior, ou quando mudavam de 4 pra 8 classificados faltando 10 rodadas, entre outros. Ou seja, o argumento é valido, mas anula a legitimidade de 70% dos campeonatos já disputados aqui.

Com um argumento: Era a criação de uma liga, e portanto não havia ligação com a última disputa de Brasileiro. Era por convite, e pra se iniciar um novo projeto, uma nova liga, convida quem pode, obedece quem tem juizo. Afinal, hipocrisia as favas, sem os 12 (mais Bahia) clubes que organizaram isso o futebol brasileiro não existe. Inclusive o Sport.

Se é bonito ou não, não sei. Mas a vida é assim. Quando algo começa, quem começou é quem dita as regras. E quem organizou aquilo tudo foram os 12 clubes (mais Bahia) capazes de bater de frente com a CBF. Como se amanhã a F-1 perder 3 equipes e fundarem uma nova categoria, a Ferrari vai ditar as regras e não a Force India, porque quem dá importancia pra aquele novo projeto é a Ferrari.

Enfim, vamos facilitar o basicão.

Se os clubes da série A (modulo verde) se recusaram a jogar com o da série B fizeram bem. Seria patético uma decisão de titulo entre duas divisões, sejam elas criadas pelo criterio que foram. Se o Sport e Guarani acharam tão absurdo assim, deviam ter feito o chororô antes de começar, não depois.

Os 13 clubes disseram que não jogariam com os times do modulo amarelo, portanto a decisão não foi do Flamengo ou do Inter, mas sim dos clubes que a enorme maioria do país torce. Eles optaram por isso e avisaram que não fariam jogo extra com ninguém. Diga-se de passagem, decisão maravilhosa a de bancar o que foi feito no começo e não mudar DURANTE o campeonato pra agradar dirigentes de clubes que votam na CBF. É exatamente aquilo que pede o torcedor e a mídia: Coerencia.

O Sport foi considerado campeão e muita gente argumenta dizendo que foi o legítimo, que não teve “asterisco”, etc.

Ok, mas então, algumas perguntas:

É mais correto dar o titulo ao vencedor da série A, que cumpriu o que os clubes parceiros decidiram, ou ao time que NÃO VENCEU A SERIE B?

Porque omitem a noticia de que o Sport nÃO VENCEU O GUARANI nos penaltis na final do módulo amarelo? Ficou 11×11, e acabou empatado.

Aí, a CBF ignorou o “acordo” dos dois clubes, absolutamente anti-ético e fora de qualquer regra do futebol, e o título foi pro Sport na decisão do quadrangular.

É legitimo?

Porque o Flamengo, pelo menos, venceu a decisão do seu modulo. E o Sport?

Sejamos razoaveis. Aquele campeonato foi um passo fantastico pro futebol brasilero crescer, mas a CBF e clubes menores não aceitaram, deu no que deu. Somado a isso a covardia de alguns grandes, que abriram as pernas por outros interesses e deixaram a CBF ser co-organizadora do torneio.

O Sport é um grande time, tem uma grande torcida e não precisa de um papel pra ser campeão brasileiro. Até porque, sabe que não é. Pois se o Flamengo é questionado por não ter encarado o campeão da série B naquele ano, o que dirá do time que não venceu a série B ser campeão brasileiro sem enfrentar nenhum dos 16 maiores clubes do país naquele ano?

Quem tem o caneco mais contestavel?

Acho que o não campeão da B, que não jogou contra nenhum time da A, que nem sequer venceu o seu módulo, poderia e deveria ser bem mais questionado do que o titulo daquele que cumpriu o acordo entre os clubes, que se recusou a fazer o que a CBF queria e que manteve o combinado.

Some isso ao lamentavel erro do meu SPFC em 2007, quando fez uma camisa “Penta Unico” e desmereceu um titulo de um rival pra vender camisa. Ignorou o que assinou, ignorou o campeonato que ajudou a criar, e passou por cima de um documento assinado pelo proprio Juvenal em 87, em nome do SPFC, dizendo que legitimava o Flamengo campeao de 87.

O que é verdade tem que ser dito. Eu reconheço que o meu clube fez algo bem feio e anti-ético, não tem problema.

MAs acho que tá na hora do torcedor do Sport e dos anti-rubro-negros espalhados por ai buscarem argumentos mais solidos e menos incoerentes.

Porque a coisa mais comum que existe nesse pais é contestar a CBF e pedir que os clubes controlem o futebol.

Quando fazem… não vale. E aí os mesmos que pedem por isso, enchem o peito e dizem: “O Sport foi o legitimo campeão”.

Desculpa irmao. Eu agradeço seu email e espero não passar por mal educado. Mas ao meu ver, se tem alguem que tem uma taça e não foi campeão em 87 é o Sport, que sequer bateu o Guarani na final do seu módulo.

Blog do Rica